“Nas últimas décadas, significativos progressos têm sido feitos na área de Inteligência Artificial (IA) em geral, em suas diversas modalidades e em suas diversas aplicações. Nas Ciências da Saúde, particularmente na Medicina, os temas IA, machine learning (aprendizado de máquina), análise preditiva e correlatos têm ganhado relevância nos últimos 5 anos, progressivamente ocupando espaço de discussão e desenvolvimento nas cadeiras acadêmicas, políticas e corporativas relacionadas à Saúde.
De fato, é compreensível que a adoção de tecnologias com potencial tão disruptivo como as relacionadas à IA levem um tempo para serem adotadas, particularmente nas áreas em interface direta com a saúde e o bem-estar das pessoas. Adotá-las requer, primariamente, conhecimento de seu potencial e de suas limitações, para que os profissionais de saúde e de gestão possam saber onde e quando aplicá-las – de modo ético e responsável. Afinal, muitas nuances envolvem a modelagem de algoritmos preditivos aplicados à saúde, a começar pela qualidade dos dados de origem, passando pela técnica dos profissionais de ciência de dados, pela calibração dos modelos e culminando em sua validação prática nas populações-alvo.
Mais recentemente, uma modalidade em particular tem atraído os holofotes da mídia e da sociedade em geral: a IA generativa, como aquela utilizada no ChatGPT. Ainda estamos lidando com predição, mas neste caso, os modelos são focados na “compreensão” da linguagem natural inserida como input, e as respostas são fornecidas também em linguagem natural. Os algoritmos precisam ser treinados em largos volumes de dados, para que possam predizer o significado das palavras ou sons justapostos em sequência – nossa linguagem natural – e produzir uma resposta igualmente coerente sob o prisma da linguagem humana.
Munida de capacidade generativa ou não, fato é que a IA aplicada à saúde abre um novo leque de possibilidades antes inimagináveis. Especificamente quando aplicada à gestão de saúde, seja corporativa (mais comumente associada à Saúde Suplementar), seja pública (mais comumente associada ao SUS – Sistema Único de Saúde), os algoritmos preditivos têm o potencial de mudar radicalmente a eficiência dos processos e conferir sustentabilidade ao ecossistema. A partir de dados diversos (tabulares, imagens médicas, traçados de exames, textos de prontuários, etc.), e utilizando-se de técnicas diversas de modelagem preditiva, os algoritmos poderão inclusive mudar a forma como nossos sistemas de saúde se estruturam e são financiados.
Como médico e cientista de dados, espero ansiosamente pelo tempo em que a saúde das pessoas possa se beneficiar em larga escala dos avanços que a IA pode fornecer. Um sistema de saúde sustentável e justo envolve uma melhor justiça distributiva em todos os seus elos – equidade posta em prática, “fornecer mais a quem mais precisa” – e, para tal, é fundamental evoluirmos nossa capacidade de predizer riscos e desfechos em geral. Imagine um sistema de saúde em que possamos priorizar pessoas de forma mais justa e eficaz nas inúmeras filas de espera que invariavelmente ocorrerão (para realização de cirurgias, exames, transplantes, etc.). Em que possamos estimar com grande precisão o custo necessário para a melhor prestação de serviços de saúde. Ou mesmo antever complicações de doenças ou eventos adversos graves dentro ou fora dos hospitais. É para isso que trabalhamos, e é nisso em que acreditamos.”